O CÉU DE LISBOA

“O Céu de Lisboa” é o título de um filme de Win Wenders, cineasta mais conhecido por Paris, Texas, Asas do Desejo ou Buena Vista Social Club. É a estória de um engenheiro de som que vai a Lisboa para encontrar um cineasta alemão e o ajudar na sonorização de um filme em construção. No entanto, ele não consegue encontrá-lo, mas na sua busca grava sons da cidade, lê a poesia de Fernando Pessoa e conhece o grupo musical Madredeus, apaixonando-se pela sua cantora, Teresa Salgueiro.  
Muitas cenas do filme se passam em Alfama, bairro famoso pelas muitas casas de fado, gênero musical que o Madredeus reinventa na sua música, ao mesmo tempo tradicional e contemporânea. Quando se chega à Lisboa pelo mar, ou pelo Tejo, rio que se confunde com o mar na sua foz, se aporta em frente ao bairro de Alfama, no atual Terminal de Cruzeiros. Assim Pessoa descreve essa chegada:  

 “Para o viajante que chega por mar, Lisboa, vista assim de longe, ergue-se como uma bela visão de sonho, sobressaindo contra o azul vivo do céu, que o sol anima." (Fernado Pessoa em Lisboa: O Que o Turista Deve Ver)



 O céu de Lisboa é de um azul profundo, que se avista do mar e do alto de Alfama. Subir as escadarias de Alfama sem rumo é um dos maiores encantos de Lisboa. Minto, desce-las, mirando o Tejo a cada vista que se revela, é mais encantador. A cada lance de escada vencido há a recompensa da descoberta de uma nova paisagem: um mosaico de telhados, fachadas, janelas, portas, roupas penduradas em varais improvisados.
Teresa Salgueiro canta o céu da Mouraria, bairro onde foram confinados os mouros em 1147, após as Cruzadas. Mouraria é o berço do fado e hoje é o bairro mais multicultural de Lisboa: “Céu da Mouraria... ouve, Vai chegar o dia novo!” (letra e música: Pedro Ayres de Magalhães)
 Pode-se subir ao Castelo de São Jorge, a partir da Praça Martim Moniz, pelas ruas da Mouraria e de lá descer por Alfama. Os dois bairros se confundem e perder-se por eles é um dos melhores prazeres em Lisboa.


“O revisor entrou em Alfama pelo Arco do Chafariz d’El-Rei, almoçara por aí, numa casa de pasto da Rua de S. João da Praça, para os lados da torre de S. Pedro, uma refeição popular portuguesa de carapaus fritos e arroz de tomates, com salada, e muita sorte, que lhe calharam no prato as tenríssimas folhas do coração do alface(...)” (José Saramago em Histórias do Cerco de Lisboa) 
Em uma das cenas do “O Céu de Lisboa”, inspirada em um episódio real, o personagem Phillip Winter, soundesigner do filme dentro do filme, aproxima-se de um grupo de meninos que brincava em um dos terraços de Alfama, com vista para o rio Tejo. E começa a mover seu microfone para captar os sons que chegavam até ali:

“O canto dos pássaros, os sinos da igreja, o vento entre as árvores, a a sirene de um barco chegando ao porto. Um a um, os meninos foram silenciando como que hipnotizados, tinham se tornado cúmplices de um senhor que os havia feito ouvir um mundo que estava ali, mas que eles não percebiam.”( André Luiz Olzon Vasconcelos em “Sinfonia de Wim Wenders: análise da trilha sonora de O Céu de Lisboa”)

Nos céus de Lisboa há muitos sons, o canto das gaivotas e das andorinhas, a voz doce de Teresa Salgueiro, os violões de Madredeus, o fado que se ouve ao longe. Há muitas cores, do límpido azul ao ocre do por-do-sol. Ouvir os sons de Lisboa, mirar o seu céu, perder-se pelas vielas de Alfama e Mouraria. 
"Viajar! Perder países!
Ser outro constantemente,
Por a alma não ter raízes 
De viver de ver somente!

Não pertencer nem a mim!
Ir em frente, ir a seguir 
A ausência de ter um fim,
E a ânsia de o conseguir! 

Viajar assim é viagem.
Mas faço-o sem ter de meu 
Mais que o sonho da passagem.
O resto é só terra e céu". 
(Fernado Pessoa-Viajar!Perder Paises!)

PS: leia esse texto ouvindo Teresa Salgueiro e Madredeus em “Céu de Mouraria”
https://www.youtube.com/watch?v=a-l_MsRFgV4
 Cenas do Filme:

Texto e Fotos: Sérgio Ulisses Jatobá

Comentários

  1. Viajei aqui sem sair do lugar! Fico agradecida pela delícia!

    ResponderExcluir
  2. Que maravilha de descrição adornadas pelo esmero das fotos e acrescidas de tão belas citações. É realmente uma nova viagem.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

O CAMINHO DE SANTIAGO POR DIFERENTES CAMINHOS (Parte 1)

NOVOS BAIRROS ALÉM DAS PORTAS DE PARIS

CUENCA – a cidade das casas colgadas